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A NOVA CULTURA UNIVERSITÁRIA

Por: Gabrielly Pereira (gabrielly@observatoriodefavelas.org.br)

As estatísticas oscilam, mas ainda não indicam igualdade na relação entre moradores de favelas e periferias que ocupam um lugar na universidade e alunos de outros territórios. Mesmo assim, o índice segue em uma crescente e muitos fatores podem ser apontados como catalisadores na relação dos jovens de periferia com o ensino superior. Segundo o IBGE, o acesso de estudantes pobres à universidade pública cresceu 400% entre 2004 e 2013. O sistema de cotas tem sido capaz de reparar gradativamente grandes diferenças históricas, mas antes de se efetivar propriamente como ferramenta de acesso, existe um longo percurso que requer instrução e orientação. Este trabalho vem sendo feito cada vez mais pela sociedade civil a partir dos pré vestibulares comunitários que não recebem em troca lucro quantitativo, em espécie, mas o retorno dos alunos que vivenciam a universidade e trazem consigo além dos novos conhecimentos, grandes experiências a serem partilhadas.

Cláudia Santos foi aluna da primeira turma do curso preparatório da Redes da Maré e agora é coordenadora executiva do mesmo projeto. Este ano, o CPC REDES DA MARÉ completa 20 anos e já aprovou cerca de 1.600 alunos, a maioria em universidades públicas, fazendo saltar de menos de meio por cento para 3% o índice de jovens na favela que cursam ou cursaram universidade. São 3 turmas na Nova Holanda, 1 na Vila do João e 1 na Vila do Pinheiro totalizando quase 250 alunos que nos anos de 2016 e 2017 tiveram 46% de aprovação. Cláudia afirma que o perfil dos estudantes mudou. “Na minha época era uma galera que tinha enterrado o ensino médio, eles estavam foram das cadeiras há muito tempo. Hoje, a maioria ainda está cursando o ensino médio”. Isso significa dizer que a preocupação com a universidade existe ainda no período escolar. Este fenômeno já é fruto da cultura universitária que se perpetua como hábito no território.

Taís Custódio é moradora do Parque União e economista formada pela UERJ. Estudou no preparatório comunitário e hoje atua no eixo de Segurança Pública e Acesso à Justiça da Redes da Maré. Seu retorno tem incidido diretamente na favela, ela participa de debates e palestras, já atuou em um projeto de educação financeira. “Tenho um grande desejo de trazer um retorno pro lugar que eu me criei. Foi o lugar que eu me formei como pessoa. Agora, eu consigo trazer um pouco do que eu passei pra cá, mas eu queria algo além”. Taís agora está se graduando no curso de geografia e planeja ser professora. Durante o relato, ela menciona situações em que apoiou e foi apoiada por amigos que tiveram dificuldades em permanecer na universidade e mostra como estar em contato com semelhantes é vital e acolhedor. Apesar da potência dos estudantes periféricos nas universidades, a assistência estudantil das instituições ainda é falha e excludente, a começar pelo processo de inscrição. Neste ano, o número de inscritos do ENEM caiu 18% e só tem sofrido decréscimos. Foram, no total, 1,2 milhões de oportunidades negadas a jovens que declararam não conseguir arcar com a taxa de inscrição da prova que em 2018 passou a custar R$82. O que se observa é a periferia ultrapassando os obstáculos de uma educação precarizada, complicações territoriais, de classe e sendo impedidos de prosseguir no seu avanço pela macro estrutura.

O preparatório também existe para os estudantes do nono ano que querem ingressar em um ensino médio técnico. Levi Germano disse que o curso serviu não só como aparato de preparação mas como um reforço escolar. Infelizmente não conseguiu realizar as provas de seleção porque precisou pausar seus estudos para trabalhar. Ele estudou em um colégio estadual e, como já sabia do pré vestibular, ingressou na terceira série do seu ensino médio. Atualmente, cursa Direito na UNIRIO e também faz parte do núcleo de Segurança Pública e Acesso à Justiça, auxiliando no andamento de processos que envolvem violência policial e violação de direitos. A presença de Levi, enquanto morador e assistente jurídico delega confiança e leva conhecimento aos moradores que não se sentem amparados pelas grandes instâncias. “A gente trabalha para que os danos das operações policiais sejam reparados como em outras partes da cidade. O nosso objetivo geral é que segurança seja um direito dos moradores e não simplesmente um termo conceitual e abstrato. Eu nasci aqui e senti na pele a turbulência de uma operação e cheguei na faculdade com essas demandas. É uma grande oportunidade pra mim acessar um privilégio de elite e contribuir pra Maré”.

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